Tuesday, December 20, 2005

CARTA ABERTA AO SR. PRIMEIRO MINISTRO

Engenheiro José Sócrates. Excelência:


Escrevo-lhe enquanto cidadão participativo que se revê em muitas das suas medidas, reveladoras de coragem política. Escrevo-lhe também na condição de professor catedrático e director de uma instituição de ensino superior privada que, imagine, trabalha graciosamente em várias universidades públicas. Fazendo o que há de mais nobre na actividade universitária, a saber, criando novos doutores.

É este mesmo cidadão que se começou a interrogar durante o Verão sobre os espaços promocionais com que as universidades públicas passaram a brindar os portugueses. Colocando na imprensa anúncios com tal abundância e qualidade que, veja lá, cheguei a pensar em escrever ao Dr. Miguel Horta e Costa, enquanto amigo, para me esclarecer quanto custariam os anúncios promocionais de telemóveis, sobretudo os de nova geração.

Cheguei a pensar, imagine, dirigir-me a algumas empresas imobiliárias que, ciclicamente, nos propõe condomínios de luxo, tão somente para saber a relação entre investimento na publicidade e o aumento de potenciais compradores de casas tão magníficas.

A minha divagação foi tão longe que me recordei das Seashells, das Maldivas, ou mesmo, dos nossos Açores ou da bela ilha da Madeira. Quanto custaria em publicidade “vender” o sonho paradisíaco de palmeiras, praias e coqueiros ou águas transparentes e cálidas, ou mesmo, lagoas de sonho perdidas nas montanhas?

Saiba, Excelência, que não o fiz por uma única razão. Saber que o primeiro ministro de Portugal pouco pode fazer face à autonomia universitária. Embora soubesse também que a deriva dos dinheiros públicos destinados à universidade, ao abrigo de uma autonomia que roça nos gastos um quase autismo corporativo, provém fundamentalmente de uma via. A dos impostos que, quer eu, quer milhões de portugueses contribuintes entregam ao Estado. Com o único fito de melhor justiça, segurança social, educação e saúde. Dito de outra forma, minorar os desequilíbrios entre os portugueses.

Mas, Excelência, silenciei-me. Apesar de saber que o modelo de financiamento, das universidades públicas deveria ter alguém que lhe pusesse a mão, tanto mais quanto são poucos aqueles que dentro da corporação académica percebem o óbvio, a saber, que à sua volta existe um país.

Chegado este ponto, tenho de lhe confessar porque decidi agora escrever-lhe. É que, para além da montra publicitária em que num só dia e num só jornal instituições públicas gastaram cerca de quarenta e cinco mil euros em anúncios, essas mesmas instituições têm agora a “coragem” de falar de favorecimento pelo Estado das instituições de ensino superior privadas. O cálculo fácil das centenas de milhares, senão milhões de euros, delapidados num despautério público têm, ainda por cima, o contraponto do protesto. E ainda, o habitual “blá-blá” sobre a falta de investimentos destinados à investigação científica. Explique-nos, senhor primeiro ministro, como tal é possível?

Sei que Vª Excelência sabe, tão bem como eu, que este dinheiro gasto sem critério é de todos nós. Ao contrário daquele que provém das famílias que optaram livremente pelo ensino privado, pagando assim a instrução dos seus filhos e dos filhos dos outros por duas vias. A Escola e os impostos.

Excelência, sei da dificuldade que tem tido em implantar as medidas necessárias para reduzir as despesas públicas, tendo aí, embora, um pequeno/grande desacordo: a Ota e o T.G.V.
Certo que não será surdo ao princípio da realidade, envio-lhe os meus melhores cumprimentos.

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